A carta-renúncia foi dirigida ao presidente da Assembleia Legislativa e insinua irregularidades dentro do Governo do Estado
A renúncia do vice-governador do Amapá, Papaléo Paes, ocorrida na terça-feira dia 7 de agosto e comunicada durante concorrida coletiva à imprensa, concedida no Palácio do Setentrião, centro nervoso do Governo, abalou os alicerces da administração estadual e deixou em alerta os órgãos do Estado responsáveis pelo controle da gestão devido aos indícios de irregularidades sugeridos pelo renunciante e que precisam ser apurados.
Durante a coletiva Papaléo disse, entre outras coisas, que havia anunciado a divulgação de uma carta-bomba devido ao que vinha percebendo ao longo da atual gestão, especialmente no caso do secretário de estado da Fazenda, Josenildo Abrantes, do qual fez fortes insinuações sob o que considera desvio de conduta.
Papaléo começou a coletiva fazendo um retrospecto de sua carreira política, lembrando os cargos que exerceu ao longo de quase três décadas de vida política. Em seguida, repetiu o que já havia revelado sobre os bastidores do acordo que fizera com o então candidato ao Governo do Estado Waldez Góes, em 2014 quando fora combinado que, nestas eleições de 2018, Papaleo Paes seria o candidato do grupo ao Senado da República.
Este ano, no entanto, o governador teria pedido para que aceitasse a candidatura de vice-governador mantendo assim, a mesma chapa na campanha da reeleição. O acordo foi fechado e o convite aceito.
Papaléo afirmou que desde o ano passado começou a perceber mudança no comportamento do atual governador Waldez Góes, dando sinais de que não estaria disposto a cumprir o acordo inicial, provavelmente devido à forte influência que os seus auxiliares mais diretos estavam exercendo sobre ele. Chegou a mencionar que o governador Waldez Góes dá sinais de estar com “a mente cansada” e, também, com vontade explícita de não cumprir o acordo de 2014 e, também, substituí-lo do cargo de vice-governador na chapa majoritária para as eleições de 2018, por outro agente que pudesse atender os seus interesses e de seus principais auxiliares, dando preferência pelo empresário Jaime Nunes.
Papaleo Paes fez questão de contar uma passagem ocorrida recentemente: “Estávamos tomando café quando o secretário (Josenildo) entrou histérico dizendo que era preciso encaixar o Jaime porque não havia dinheiro para a campanha. Eu respondi que já tinha Gilvam e Lucas para o Senado, e eu na vaga de vice. Ele (Josenildo) respondeu que eu precisava entender que se tratava de um projeto”.
Na semana passada, Papaléo Paes tornou púbica sua insatisfação, abrindo uma crise sem precedentes entre ele e o governador Waldez Góes. Chegou a afirmar que tinha a tal carta-bomba para divulgar. No último dia 4, em convenção, o PDT, presidido no Estado por Waldez Góes, indicou Jaime Nunes para ser o candidato ao cargo de vice-governador, em coligação com o partido do empresário.
Devido já ter assumido o Governo do Estado no período em que o Calendário Eleitoral define a desincompatibilização, não poderia Papaleo Paes disputar outro cargo senão aquele que exerce no momento – o de vice-governador.
O acordo firmado em 2014 e reconfirmado em 2018 não foi honrado pelo governador Waldez Góes, presidente do PDT, deixando o então vice-governador sem alternativa para disputar qualquer outro cargo.
“Se fosse uma briga física com ele (Waldez), uma semana depois já estaríamos em paz. (…) Não posso mais conviver nesse ambiente”, disse ele. É importante salientar que essa narrativa em coletiva de imprensa foi feita bem ao lado do gabinete de despacho do governador.

Traição
Papaléo Paes se lembrou do momento e dos dias seguintes do que foi a Operação Mãos Limpas, deflagrada pela Polícia Federal no Amapá, no dia 10 de setembro de 2010, quando procurou compreender as razões de Waldez Góes, então postulante a uma cadeira no Senado da República e sua família, mantendo-se fiel e leal à amizade entre os dois. Ele citou um convite de empresários do Amapá para integrar um movimento que pretendia eleger um novo governador, a partir da indicação das empresas. Ele afirmou que recusou o convite.
“Sempre fui leal a ele. (…). Sempre acreditei em sua inocência. Ele sempre me chamou de amigo, irmão e conselheiro. E me traiu dessa foram.”

Denúncia
Papaléo Paes disse que existe uma podridão na política do Amapá, e insinuou que secretários do governo estariam praticando atos de corrupção.
“Os secretários ganham R$ 9 mil líquidos, mas alguns ostentam riqueza nas redes sociais, com carrões. (…) Soube disso apenas agora. Não sou X-9”, justificou ao ser questionado sobre uma possível omissão com esse tipo de ocorrência.
“Escrevam o que eu estou dizendo, esse Josenildo ainda vai dar muito problema para esse governo”, acrescentou.
O vice-governador ainda ressaltou que a Justiça Eleitoral precisará aumentar a vigilância sobre a prática de caixa 2 na campanha, e revelou que recebeu convites de outros grupos políticos que estão na disputa eleitoral em 2018.

Renúncia
No fim da coletiva Papaléo Paes leu uma carta, endereçada ao presidente da Assembleia Legislativa, na qual deixava claro que renunciava ao cargo de vice-governador do Estado do Amapá, destacando que a vontade não era renunciar, mas devido ao que acontecera, não via alternativa.
“(…) Não devemos permitir que a palavra proferida como compromisso seja somente falácia que acaba violando pressupostos básicos da política”, diz ele em trecho do documento.
Com a renúncia do vice-governador do Estado e prevendo que o presidente da Assembleia Legislativa é candidato à reeleição em um dos 24 cargos de deputado estadual, o próximo da linha sucessória, definido na Constituição do Estado do Amapá, é o presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Amapá, desembargador Carlos Tork.

Governo
Após a divulgação da carta-renúncia do vice-governador do Amapá Papaléo Paes, o governo do Estado distribuiu nota sintetizando a posição da administração. Diz a nota: “1. A renúncia do atual vice-governador é uma decisão de foro estritamente pessoal;
2. O Amapá vive plenamente o ambiente de amadurecimento e estabilidade de suas
instituições;
3. A decisão do vice-governador deve ser respeitada como parte do processo
democrático”.
O secretário de estado da Fazenda, citado nominalmente pelo vice-governador, em nota de repúdio, assim se manifestou: “Refuto os ataques irresponsáveis de que fui vítima e recorrerei, inclusive, à esfera judicial em defesa de minha honra e dignidade. Quem tem a coragem de acusar, deve assumir o ônus de provar”. Josenildo Santos Abrantes.