Em 2018 a arrecadação total já ultrapassou o montante de 17 bilhões de reais. Essa é a referência preferida do futuro ministro.
O futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que deverá “meter a faca” no Sistema S durante almoço com empresários e políticos na sede da Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro) na segunda-feira, dia 17 de dezembro.
O sistema inclui entidades como Sesc, Senac, Sesi e Senai. O argumento é que a entidade deverá se adequar à lógica de corte de custos do próximo governo.
“Tem que meter a faca no Sistema S. Vocês acham que a CUT (Central Única dos Trabalhadores) perde sindicatos, e aqui continua tudo igual, com almoço bom?”, questionou o futuro ministro, em referência ao fim da obrigatoriedade da taxa sindical, aprovada na Reforma Trabalhista.
Segundo Guedes, os cortes podem ser entre 30% e 50% do repassado atualmente. Marcos Cintra, economista que vai comandar a secretaria especial da Receita Federal, confirmou a informação em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”.
Os especialistas avaliam que o sistema faz parte da sociedade e deverá passar também pelo regime de cortes, o que é preciso, no entanto, é entender qual o atual impacto social do Sistema S para avaliar melhor esta medida. Entidades dizem que possíveis cortes terão impactos sociais relevantes.

O que é o Sistema S
O chamado Sistema S é o conjunto de instituições corporativas voltadas a treinamento profissional, pesquisa e assistência técnica e social.
Ao todo, são nove instituições (todas iniciadas com S – daí o nome), estabelecidas pela Constituição Federal, cada uma delas voltada a uma área de atuação, como indústria, comércio, agronegócio e cooperativismo.
Cada órgão de serviço tem seu nicho e objetivo. Dois tratam da indústria: o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), mais antigo deles, voltado à qualificação de mão de obra, e o Sesi (Serviço Social da Indústria), voltado ao aperfeiçoamento do ambiente de trabalho.
Também há dois para o comércio: o Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio), mais numeroso deles, voltado à mão de obra, e o Sesc (Serviço Social do Comércio), responsável pela área de lazer dos afiliados.
Para o desenvolvimento de pequenos negócios e microempreendedores, há o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas); para a mão de obra agrícola, o Senar (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural), e também o Sescoop (Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo), o Senat (Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte) e o Sest (Serviço Social de Transporte), voltados às respectivas áreas.

Como funciona o financiamento e o que o governo tem a ver com isso
De cunho privado, as organizações sobrevivem do repasse público. A diminuição desse repasse já foi debatida em diferentes governos, especialmente em épocas de crise.
O surgimento das instituições se deu no governo Getúlio Vargas. Em janeiro de 1942, o então presidente decretou a criação de uma instituição com objetivo de formar profissionais para a crescente indústria nacional. Assim nasceu o Senai.
De acordo com a lei, a nova instituição seria mantida com recursos dos empresários e administrada pela CNI (Confederação Nacional da Indústria).
Desde então, as outras instituições foram formadas sob a mesma lógica: uma parte da folha de pagamento das empresas é repassada às federações patronais, cada uma com sua categoria respectiva, que administram os serviços de aperfeiçoamento profissional. No caso do Senai, a CNI, por exemplo.
O repasse é previsto na Constituição, e a alíquota varia de acordo com a instituição. Atualmente, vai de 0,2% a 2,5%. A maioria, como Senai e Sesi, está na faixa do 1%.
Em 2017, o repasse total foi de R$ 16,5 bilhões. Neste ano, já passou dos R$ 17 bilhões. O corte proposto por Guedes seria aplicado nesta quantia.

Faltam dados para avaliar impactos
A polêmica da diminuição do repasse para o Sistema S não é nenhuma novidade. Toda vez que ela é discutida, há a pesagem de prós e contras.
“Já se sabe que só a reforma da Previdência não é suficiente para trazer o equilíbrio fiscal necessário. Esta é mais uma tentativa de Paulo Guedes de tentar sanar as contas”, afirmou Agostinho Pascalicchio, professor de engenharia econômica da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
De acordo com o especialista, antes de entrar na polêmica e até de estabelecer uma base de cálculo para corte, é preciso entender o real impacto que as instituições do Sistema S têm sobre a população e seus beneficiados, algo não tão bem divulgado pelas entidades.
“Quantos foram os aprendizes, quantas pessoas se formaram? Qual o custo por indivíduo? Qual o real benefício social dos cursos? Quantos empresários receberam o apoio?”, questionou o professor. “Eu pesquisei e não encontrei, parece-me nebuloso. É preciso perguntar com transparência qual o efeito.”
Pascalicchio disse também que esse debate já vem sendo travado há um tempo. “Lá em 2015, o Joaquim Levy, quando ministro da Fazenda do governo Dilma Rousseff, já pretendia reduzir”, afirmou o professor. “Ele já queria adequar a sociedade como um todo aos cortes. O Sistema S faz parte disso. A mesma lógica funciona agora.”
Segundo ele, quanto mais dados quantitativos as entidades oferecerem, mais adequado pode ser esse corte. “Não podemos usar adjetivos, precisamos de números para entender os benefícios. Não é ‘corte estrondoso’, mas quantos são beneficiados e quantos vão perder”, questionou Pascalicchio.

Fechamento de cursos
De acordo com a CNI, o Sesi registrou, no último ano 1,18 milhão de matrículas em educação básica, continuada e ações educativas, enquanto o Senai teve 2,37 milhões de matrículas de educação profissionalizante.
Somados, os dois institutos têm mais de mil escolas pelo país, quase 60 mil funcionários e atendem cerca de 20 mil empresas. Segundo o órgão, o corte no repasse pode afetar diretamente estes serviços. A instituição não divulgou, no entanto, onde esses dados podem ser acessados pela população.
O Sest e o Senat, da área de transportes, afirmam que, só em 2018, foram realizados 8,6 milhões de atendimentos em todo o país e que o corte afetará diretamente esses serviços.
“Hoje, são 148 unidades operacionais, garantindo 8.700 empregos diretos para atender, com excelência, mais de 2 milhões de caminhoneiros e taxistas, demais empregados de cerca de 200 mil empresas transportadoras, além de seus familiares, em todo o Brasil”, declarou Clésio Andrade, presidente da CNT (Confederação Nacional do Transporte), que gerencia as instituições, e dos conselhos nacionais de ambas.
Ainda não está claro de quanto será o corte. Na reunião, Guedes mencionou entre 30% e 50%.
Pascalicchio afirmou que, além de esclarecer esse valor, o governo também precisa explicar qual será a contrapartida dada às entidades. “Não temos a quantidade clara de redução dos encargos das federações, se ele pretende reduzir em montante igual para os valores repassados e para os encargos cobrados sobre essas instituições”, afirmou o professor.