Rodolfo Juarez

Mais uma vez usuários do transporte fluvial, com saída de Santana, choram a perda de parentes e amigos em um naufrágio que poderia ser evitado se houvesse, por parte das autoridades responsáveis pelo licenciamento de embarcações para transportar passageiros, mais cuidados e respeito, tomando como exemplo fatos igualmente lamentáveis ocorridos, como lembrança pertinente, com o B/M Novo Amapá, há 39 anos e com o B/M Cidade de Óbidos VI, há 18 anos.
Não pode ser considerado como mera coincidência que essas tragédias tenham ocorrido pela parte noturna, durante a madrugada. Foi assim em 1981 e 2002 e agora em 2020, cada uma tratada como se fosse obra do destino ou do acaso. Não pode ser isso não, mas parece o resultado do pouco caso como é tratada a navegação fluvial na Amazônia, especialmente na Amazônia Oriental.
Recentemente foi arquivado o processo que tramitava na justiça, ingressado pelo saudoso advogado Pedro Peticov, referente à tragédia do B/M Novo Amapá, sem a resolução do mérito e ficando, assim, a sociedade local e as pessoas diretamente atingidas, sem a responsabilização dos entes públicos que estavam no polo passivo daquele processo. Mais uma vez não havia lista de passageiros e se estima que, pelo menos, 300 vidas foram perdidas na madrugada de 6 de janeiro de 1981.
Depois a tragédia do B/M Cidade de Óbidos VI, com 108 passageiros, também sem as autoridades conhecerem, previamente, a lista de passageiros embarcados em Santana no dia 25 de janeiro de 2002, e com carga acompanhada e carga-frete, sem o devido registro do peso e com o agravante do comandante permitir o embarque de passageiros durante o trajeto. Mais uma vez o sul do Amapá foi o local da tragédia que deixou 7 pessoas mortas
Agora, no dia 29 de fevereiro de 2020, outra saída, agora do B/M Anna Karolina III do Porto do Grego, classificado como precário pela Marinha do Brasil, também sem dar conhecimento da lista de passageiros e do romaneio de carga, que naufragou, também no sul do Amapá, e também de madrugada, desfazendo famílias que se valiam do transporte fluvial para chegar aos locais planejados e que tiveram os seus planos interrompidos, morrendo afogados: crianças, adultos e idosos. Não se conhece os números finais da tragédia, mas se aproxima de 30 as vidas perdidas.
Destacar esses três momentos pode despertar as autoridades federais, estaduais e municipais, que não conseguiram priorizar, até agora, os planos que atendam ao sistema de transporte fluvial de passageiros utilizando os rios navegáveis da região como vias para transporte de passageiros, como as rodovias e aerovias.
A movimentação do Ministério Público Estadual, do Ministério Público Federal, dos prefeitos e alguns parlamentares federais, pode motivar o Governo do Estado a quebrar a inércia que o deixa impotente nesses momentos tão graves para os interesses da população, atuando apenas na assistência aos que não morreram.
A construção de terminais de passageiro e carga acompanhada, definição de rotas, de procedimentos técnicos para liberação de embarcações motorizadas atuarem naquelas rotas, identificação dos responsáveis técnicos pela construção e testes de carga, manobrabilidade e navegabilidade das embarcações, além de amplo processo educativo para uso dos barcos regionais de passageiros é urgente e precisa receber o carimbo de prioridade para atender o número crescente de passageiros que se deslocam pelas hidrovias e que já ultrapassou, faz tempo, o número daqueles que usam o avião — estes contando com terminal adequado, lista de passageiros, regras de navegação e horário certo de pouso, decolagem e navegação.