A gravação ambiental foi feita clandestinamente e sem fins pedagógicos, por uma aluna em sala de aula
“Não é lícita, nem sequer para fins administrativos, a gravação ambiental feita clandestinamente por aluno sem fins pedagógicos. Sala de aula não é campo para uma polícia ideológica, um patrulhamento por jovens a serviço do constrangimento.”

O desembargador relator do Mandado de Segurança foi didático na ordem de devolver o cargo ao professor (Arte: site tudosalade.com).
O entendimento é da Quinta Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina e integra a fundamentação de acórdão que acolhe mandado de segurança para anular processo administrativo que resultou no afastamento, antes do término do contrato de trabalho, de um professor temporário de História que teve sua fala gravada por uma aluna em sala de aula.
O caso aconteceu em uma escola da rede estadual de ensino de cidade da Grande Florianópolis e ganhou grande repercussão nas redes sociais. Isso porque, na manifestação aos alunos, o docente chamou determinado agente político de “nazista” e “ladrão”.
As colocações geraram debate acalorado na sala de aula. Posteriormente, o áudio captado foi obtido por dois parlamentares, que exploraram os assuntos em suas redes sociais.
No voto condutor do acórdão o relator, desembargador Hélio do Valle Pereira, destaca que: “[…] Não é lícita, nem sequer para fins administrativos, a gravação ambiental feita clandestinamente por aluno sem fins pedagógicos. Sala de aula não é campo para uma polícia ideológica, um patrulhamento por jovens a serviço do constrangimento. Há liberdade de cátedra, uma das projeções do livre pensamento. O professor não está exposto a censores discentes nem está à disposição de visões idiossincráticas de bedéis mascarados como pais. A Constituição tem amplitude bastante para propiciar perspectivas distintas, que haverão de ser asseguradas no pressuposto da recíproca tolerância. Não há (nem pode haver) univocidade. A democracia não está sendo compreendida quando uma maioria deseja derrogar o grupo minoritário […]”.
Para o magistrado, a decisão pelo afastamento do professor demonstra ausência de correlação lógica entre os fatos apurados e o tipo administrativo imputado (ineficiência desidiosa), pois há indicativos de que o docente, mesmo se comprometendo perante a administração escolar a não dar prosseguimento a debates de natureza política em sala de aula, teve a demissão confirmada pela pressão de pais dos alunos.”
Ao conceder a segurança para anular a dispensa do servidor temporário, o desembargador registra que, embora prejudicado o retorno ao cargo, porque expirado o prazo do contrato administrativo temporário, o acórdão “servirá de título executivo ao impetrante, que poderá exigir o pagamento de acordo com as regras aplicáveis ao cumprimento de sentença em face da Fazenda Pública.” (Mandado de segurança cível número 5071263-27.2024.8.24.0000)